Mesmo depois da Operação Pixuleco II, em agosto de 2015, quando foram presos um lobista e um advogado sob suspeita de serem os operadores, os desvios milionários sobre empréstimos consignados continuaram
A Polícia Federal e a Procuradoria da República descobriram que o fundo Consist — cujo mentor e beneficiário maior teria sido o ex-ministro Paulo Bernardo (Planejamento/Governo Lula e Comunicações/Governo Dilma) — continuou operando mesmo depois da deflagração da Operação Pixuleco II, em agosto de 2015, quando foram presos um lobista e um advogado sob suspeita de serem os operadores do esquema de desvios milionários sobre empréstimos consignados.
Paulo Bernardo, preso na quinta-feira na Operação Custo Brasil, deixou o governo Dilma em 2015. A investigação mostra que, mesmo depois da saída dele do Ministério das Comunicações, o fundo Consist ainda se mantém ativo.
Deflagrada na quinta-feira, a Custo Brasil culminou com a prisão do ex-ministro e de mais dez investigados por suposto desvio de R$ 100 milhões no âmbito dos consignados. Na sexta-feira, o procurador defendeu a manutenção da ordem de prisão preventiva de Paulo Bernardo.
— Além de casos de tentativa de obstrução da investigação, o Ministério Público Federal entende que a prisão, embora medida excepcional, se faz necessária para neutralizar esse risco, seja de reiteração, seja de novas condutas fraudulentas. E mais: esse valor (desviado) tem que ser recuperado. A finalidade do processo penal também é recuperar o patrimônio obtido ilicitamente. Essa é uma finalidade do processo penal e a aplicação da lei penal, nesse sentido, é de recuperar parcela desses valores.
Quando aponta "casos de tentativa de obstrução da investigação", o procurador da Custo Brasil se refere ao detalhe de que, após a Pixuleco II, que prendeu o ex-vereador do PT de Americana (SP) Alexandre Romano, o Chambinho — suposto lobista da organização criminosa que desviou R$ 100 milhões dos consignados, dos quais R$ 7,1 milhões teriam sido destinados ao ex-ministro —, houve registros de "atitudes fraudulentas para induzir em erro a Justiça".
Naquela mesma ocasião, agosto de 2015, foi alvo de buscas o escritório do advogado Guilherme Gonçalves, em Curitiba, apontado como repassador de propinas a Paulo Bernardo e pagador de contas eleitorais da senadora Gleisi Hoffmann (PT/PR), mulher do ex-ministro.
A petista é investigada no Supremo Tribunal Federal (STF), Corte máxima que detém competência para processar políticos com foro privilegiado. O advogado Guilherme Gonçalves também teve a prisão decretada na Operação Custo Brasil, mas está foragido. Por meio de sua assessoria ele disse que vai se entregar à Justiça Federal.
A Custo Brasil é um desdobramento da Pixuleco II, a fase da Operação Lava-Jato que pegou o fundo Consist, para o qual eram canalizados recursos desviados da trama dos consignados. A Consist é uma empresa de software que fez acordo com entidades contratadas pelo Planejamento na gestão de Paulo Bernardo, em 2010. Cabia à Consist gerenciar o dinheiro emprestado por milhões de servidores públicos.
Segundo o procurador da República Andrey Borges de Mendonça, foi verificada a simulação de contratos de serviços após o desencadeamento da Pixuleco II. O plano seria tentar conferir uma aparência de legalidade a transferências de valores sob suspeita.
— Houve atos nesse sentido, de tentar simular uma prestação de serviços — declarou Andrey Borges.
O procurador reafirmou os motivos do decreto de prisão preventiva do ex-ministro do Planejamento.
— O esquema permaneceu durante mais de cinco anos. Não era um esquema isolado, um ato isolado. Era um esquema permanente e estável em que havia recebimento de valores altos, valores milionários. Em alguns casos, isso não se aplica a todos, se verificou atitudes fraudulentas para induzir em erro o juízo, como por exemplo por meio da simulação de contratos de serviços após a deflagração da Pixuleco II, em agosto de 2015. Houve atos nesse sentido de tentar simular uma prestação de serviços — declarou Andrey Borges na sexta-feira, após audiência de custódia de Paulo Bernardo e de outros alvos da Custo Brasil.
Na audiência, Paulo Bernardo afirmou que "não recebeu nenhum centavo desse esquema". Ele contestou o recebimento de valores. Seus advogados argumentaram que "não há" motivos para que o ex-ministro permaneça preso. Mas o Ministério Público Federal e o juiz Paulo Bueno de Azevedo, da 6ª Vara Federal Criminal em São Paulo consideram que os indícios contra Paulo Bernardo são fortes e suficientes para que ele seja mantido em custódia.
A Custo Brasil ganhou força a partir das delações premiadas de Chambinho e do ex-senador Delcídio Amaral (ex-PT/MS). Eles revelaram a extensão do fundo Consist. Mas não apenas as revelações de Chambinho e Delcídio deram base à operação que pôs atrás das grades o ex-ministro e lança suspeitas sobre outro ex-ministro petista, Carlos Gabas (Previdência), alvo de buscas. A Justiça mandou conduzir coercitivamente Gabas, mas como ele preferiu se manter em silêncio nem foi levado à PF para depor.
— Além das colaborações há diversos elementos de provas, especialmente sobre o chamado fundo Consist, que era o fundo que o senhor Guilherme Gonçalves (advogado de Curitiba) gerenciava — destaca o procurador Andrey. — Esse fundo aponta para pagamentos de despesas pessoais de Paulo Bernardo. Ressalto que estamos tratando aqui de investigação, não de condenação.
O procurador anotou que "as evidências apontam que havia pagamentos pessoais, não só de apartamento, mas banais, celulares, contas básicas".
— O Ministério Público Federal está convencido de que já indícios suficientes para a manutenção da prisão de Paulo Bernardo.
Na quinta-feira, quando Paulo Bernardo foi preso, seus advogados, em nota, alegaram que a medida "é ilegal".
— A defesa não teve acesso à decisão ainda, mas adianta que a prisão é ilegal, pois não preenche os requisitos autorizadores e assim que conhecermos os fundamentos do decreto prisional tomaremos as medidas cabíveis — afirmaram os criminalistas Verônica Sterman e Rodrigo Mudrovitsch.
Postar um comentário